sexta-feira, maio 21, 2004

Não praticantes I

Não sou jurista, nem teólogo, nem sou muitas outras coisas.
No entanto aguardava a nova Concordata pelo facto de ser importante para muitos Tugueses.
Um estado moderno trata todas as crenças religiosas em pé de igualdade e de uma forma transparente, ainda que haja uma religião 'oficial', como por exemplo nos países escandinavos
Sendo realista, não acredito que a nova Concordata, ou a legislação que a implementará, tenham, a curto prazo, efeitos visíveis na sociedade tuguesa.

Alguém me disse um dia que a maioria dos Tugueses são 'Católicos das três etapas', ou seja:
são baptisados, casados e sepultados segundo os ritos da Igreja Católica Romana.
Intitulam-se 'não praticantes'.
Tenho muita dificuldade em perceber o Cristianismo sem prática quotidiana.
Não me parece que a hierarquia Católica aceite ver o seu Cristianismo como uma 'religião modular' em que cada 'crente' escolhe os 'módulos' que quer, que precisa, ou que melhor se adaptam ao seu estilo de vida.
Claro que percebo que seria um problema para o Episcopado aceitar que em vez de um país de 90% de Católicos, a Tugulândia seja um país onde a maioria da população é religiosamente indiferente, e onde os Católicos Romanos praticantes sejam a maior das minorias.

Para os que não praticam mas que casaram, ou pensam casar, 'pela Igreja' recomendo que leiam o seguinte artigo da nova Concordata e pensem.

Artigo 15

1. Celebrando o casamento canónico os cônjuges assumem por esse mesmo facto, perante a Igreja, a obrigação de se aterem às normas canónicas que o regulam e, em particular, de respeitarem as suas propriedades essenciais.

2. A Santa Sé, reafirmando a doutrina da Igreja Católica sobre a indissolubilidade do vínculo matrimonial, recorda aos cônjuges que contraírem o matrimónio canónico o grave dever que lhes incumbe de se não valerem da faculdade civil de requerer o divórcio.


Vá lá! Pensem mais um bocadinho.
Quando a união entre duas pessoas começa com um compromisso que não é totalmente assumido, ou parte de um pressuposto falacioso, mal vão as coisas.

Ou será que também se pode ser 'honesto não praticante'?

bjinhos & abraços


a FRASE do dia

To be born a gentleman is an accident
To die a gentleman is an achievement.


I forgot who wrote this but it makes sense.
It's either my PDI or oldstimers related.

o ARTISTA do dia - Alexandre O'Neill

Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.


Alexandre O'Neill - No Reino da Dinamarca




quarta-feira, maio 19, 2004

A nova Europa

Depois do último alargamento os analistas mais conservadores opinam que a UE/25 é como um avião: 'Se não andar para a frente, cai...'
Felizmente há pelo menos uma voz discordante. Um analista radical de esquerda diz que a UE/25 é como um tubarão: 'Se não andar para a frente, morre...'

Entretanto, muitos Tugueses e seus regedores ficaram contentes ao saber que no passado dia 1 de Maio a Tugulândia deixou de ser o último dos países UE/15 para passar a ser o número 15 na UE/25.
Pois em quinze dias já ouve alterações.
No que respeita à competividade económica já estamos em 17° lugar.
Daqui a cinco anos veremos ...

bjinhos & abraços


a PERGUNTA do dia

Constituição da Républica Portuguesa

Artigo 13.º
(Princípio da igualdade)

1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.

2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.

Será por causa do número? Estarão os supersticiosos no poder?


Coisas apegadiças

Ficámos a saber pelo Nuno Pacheco no Público que os americanos têm uma nova 'cruzada', tentando impedir que adolescentes vejam filmes onde o tabaco seja utilizado como adereço, classificando tais filmes para maiores de 18 anos.
Por isso ontem durante um jantar com amigos fiquei preocupado.
Com os cigarros e cigarrilhas pós-prandiais lembrei-me do tabagismo passivo.
(Se puder responsabilizar os outros pelos vinte anos em que fumei, tanto melhor.)
À minha frente estava um careca.
Não um desses que segue a moda capilar, mas um dos verdadeiros!
Como qualquer quarentão, tento (sem grande sucesso) manter a minha cabeleira, por isso pensei:
Tenho que evitar estar perto deste tipo!
E se também houver alopécia passiva?

bjinhos & abraços


o ARTISTA do dia - James L. Orwin

Love Will Keep

Love will keep,
the way lettuce will keep
in a fridge.

You want it.
You chose it.
Gradually you see less often
into the salad box,
beneath the yoghurts
and double cream;
far below the tins of pink fish,
the bottles of red wine.

I will warn you:
when you look you will not find
what you left.

After all,
a lettuce is simply water
beautifully structured.

Now tell me:
what is love?


James L. Orwin
(About Larkin 9 – April 2000)


terça-feira, maio 18, 2004

in fact

Only 4% of US films are made by women, compared to 25% in Iran.

(The Observer – 18th January 2004)


a PERGUNTA do dia

Import workers or export jobs?

US$ 20,000 for the best answer....

www.shelleconomistprize.com


o ARTISTA do dia - Ary dos Santos

Poeta Castrado, Não!

Serei tudo o que disserem
por inveja ou negação:
cabeçudo dromedário
fogueira de exibição
teorema corolário
poema de mão em mão
lãzudo publicitário
malabarista cabrão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!

Os que entendem como eu
as linhas com que me escrevo
reconhecem o que é meu
em tudo quanto lhes devo:
ternura como já disse
sempre que faço um poema;
saudade que se partisse
me alagaria de pena;
e também uma alegria
uma coragem serena
em renegar a poesia
quando ela nos envenena.

Os que entendem como eu
a força que tem um verso
reconhecem o que é seu
quando lhes mostro o reverso:

Da fome já não se fala
é tão vulgar que nos cansa
mas que dizer de uma bala
num esqueleto de criança?

Do frio não reza a história
a morte é branda e letal
mas que dizer da memória
de uma bomba de napalm?

E o resto que pode ser
o poema dia a dia?
Um bisturi a crescer
nas coxas de uma judia;
um filho que vai nascer
parido por asfixia?!
Ah não me venham dizer
que é fonética a poesia!

Serei tudo o que disserem
por temor ou negação:
Demagogo mau profeta
falso médico ladrão
prostituta proxeneta
espoleta televisão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!

José Carlos Ary dos Santos

segunda-feira, maio 17, 2004

Fantasmas do passado

Viajava num desses expressos rodoviários que de 'expresso' só têm o nome.
Nos 130 Km de percurso entre as duas cidades fez três escalas... mas isso será para um outro post.
Normalmente aos fins de semana viajo rodeado de turistas incautos e universitários, por isso estranhei que o autocarro estivesse quase cheio de mulheres de todas as idades, cores e línguas, acompanhadas de crianças.
Como para mim o dia tinha começado às cinco da manhã, dormitei e acordei surpreendido pela primeira paragem e pelo movimento de saída da maioria dos passageiros.
Alcoentre. Visita de sábado. Prisão velha, guardas prisionais.
Revi-me com seis anos, calções e chapéu 'inglês'.
(lembram-se do chapéu do Guilherme? Sim esse dos livros!)
A visita quinzenal ao meu pai.
Tenho poucas memórias até aos meus 10 anos, mas fui surpreendido pelas imagens quase nítidas dessas visitas. 1967, 68, 69 ...
A viagem, a espera, as 'lembranças' para o senhor director e para o chefe dos guardas, o escritório e a chegada do meu pai na sua farda cinzenta.
Já era díficil ser o único da turma cujo pai não vivia em casa, mas ter o pai preso era uma humilhação permanente.
Só mais tarde percebi que a reacção de alguns pais de colegas e amigos em relação à minha presença, eram ditados pelo repúdio ou pela solidariadade em relação à situação do meu pai. Também eu era culpado.
Foi duro, passar de 'classe média' a 'classe abaixo da média'.
Nós não podemos! O dinheiro não chega!
Mas pior era imaginar o quotidiano do meu pai. Li sobre os presos e as prisões.
Sofri. Sonhei. Cresci.
Liberdade condicional. Mas o meu pai não voltou para casa.
O cadastro que acompanha o antigo preso. Trabalho condicional. Vida condicional.
A distância, mais emocional do que física, a aumentar.
Assim que pôde o meu pai saiu do país.

Quase quarenta anos depois pouco mudou na Tugulândia.
A vingança e o estigma social em vez da punição e reabilitação.
Claro que o discurso e a forma mudou. Mas no fundo?
Péssimas instalações. Abuso e corrupção.
Desarticulação da família do preso. Reabilitação quase impossível.
Mais especialitas, mais doutoramentos, mais funcionários, mais fundos.
Resultados semelhantes. Disso somos culpados, todos.

Ao ver aquelas crianças a dirigirem-se aos portões verdes da minha infância, sofri.
Sejam fortes, sonhem e estudem. Contra tudo e todos.

bjinhos & abraços


Monday, bloody monday

Como a semana passada foi profissionalmente muito violenta, ontem decidi giboiar o mais possível .

Mas tudo tem um preço! Hoje o carro está com tosse convulsa e embora eu não o use tive que o levar ao 'dótor' pois a família precisa dele.
Quando regressei a casa e fui buscar a minha 'acelera' tinha o pneu de trás vazio...
Felizmente que não era furo (até ver).

É demais para uma segunda-feira!

bjinhos & abraços


sexta-feira, maio 14, 2004

o ARTISTA do dia - Leonard Cohen

I’D LIKE TO READ

I’d like to read
one of the poems
that drove me into poetry
I can’t remember one line
or where to look

The same thing
happened with money
girls and late evenings of talk

Where are poems
that led me away
from everything I loved

to stand here
naked with the thought of finding thee


Leonard Cohen
Stranger music – selected poems and songs

Concupiscência

Uma das muitas cenas tristes que me fez criar o blog foi a seguinte:

Uma cidade Tuguesa. Capital de distrito. Um parque de estacionamento pago, no centro da cidade. Um agente da PSP fardado, com rádio e armado, passa revista aos papelitos no interior doa carros.
Um, dois, três carros, tudo em ordem.
Uma senhora casa dos 50 aproxima-se e diz ao agente algo que não ouvi.
A resposta foi sonora e pública: 'Telefone ou vá ao posto!'
'Não me diga que não pode chamar a patrulha aí pelo rádio' clamou já irritada a cidadã.
'Não, não posso, não estou de serviço!' respondeu o agente em tom de acordão.

...???...

Quando horas mais tarde comentei o facto com uns amigos, o que mais próximo está da coisa autárquica disse impassível:
'Claro! A Câmara concessionou a exploração do parque de estacionamento a uma empresa, que depois solicita à PSP agentes para serviços gratificados...'

Alguém pode desmentir isto? Please, please??????

bjinhos & abraços


Blogisticamente escrevendo

Como em muitas coisas importantes na minha vida, cheguei à blogoesfera por acaso. Até ao outono do ano passado já tinha lido algumas referências aos weblogs literários, académicos, políticos, do mundo 'saxofónico', mas desconhecia completamente o crescimento exponencial que os blogs estavam a ter na Tugulândia.
Um dia de novembro cheguei a um blog onde uma jovem se propunha educar os psidónios Tugueses. Fiquei fã, acompanhei e 'sofri' quando a jovem decidiu 'matar' o blog.
Talvez a jovem reconhecesse que não há pedagogia que consiga educar certos espécimes.
Mas afinal a jovem propunha-se voos muito mais altos e o novo blog rapidamente teve níveis de audiência invejáveis. Escreve muito bem e tem a diferença dos espíritos atormentados. Foi ela que me baptisou 'Gafanhoto' (grasshopper) por referência à relação mestre/discípulo da velha série de TV Kung-Fu. A venerável Mestra continua a escrever, o gafanhoto continua a ler, embora sem diálogo. Aprendi muito sobre o ciberespaço em geral e a blogoesfera em particular. Como sempre os caminhos cruzam-se exactamente porque vêm de, e seguem para, direcções diferentes.
Outros vieram, impressionaram e ficaram como o TheOldMan, a Praça da Républica, a Rua da Judiaria, a G.L. do Queijo Limiano ou os Ultimatos. Outros estão em observação, mas muitos vêm e vão sem deixar marcas. Por isso mesmo espero que o Tugulândia não seja mais um blog a chover no molhado. Como sou analfabeto funcional nas coisas dos computadores tenho a direcção técnica do velho amigo Nikonman que fará o favor de minorar os riscos e limitar as crises.
Este blog falará da Tugolândia, terra do non-sense institucional, de outras paisagens, mas também da gente boa, sensível e inteligente que ainda se vai encontrando. O Gafanhoto dirá dos seus sentimentos e pensamentos, alegrias e frustrações.
Veremos se consigo.

bjinhos & abraços


quinta-feira, maio 13, 2004

Declaração de princípios

Assim seguramente não me esquecerei da data, 13 de Maio não se esquece.
A Tugulândia foi onde nasci, cresci e vivi um terço da minha vida adulta.
Voltei!
Nos últimos meses tenho tentado aprender a viver na cretinocracia.
Este blog dirá dessa aprendizagem, dos pequenos riens e das coisas importantes para mim.
Dirá também de mim, de quem sou e que caminhos tento trilhar.

Bem-vindos à Tugulândia!
Nós os Tugueses somos cordiais com os visitantes. (mas não abusem, que já perdi o servilismo)


bjinhos & abraços


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